Há beijos que se repetem. Roteiros prontos. Automatismos de lábios que se encontram por impulso, desejo ou costume. Mas… existem aqueles raros, quase míticos, que param o tempo. Que se cravam na pele como um arrepio eterno. Que não terminam quando os lábios se separam — porque continuam em pensamento, em memória, em saudade.
Foi assim com ele.
Não foi o toque. Nem a temperatura. Nem mesmo a técnica. Foi o instante. A suspensão entre o querer e o não saber o que viria depois. A hesitação que antecede o mergulho. E, então, o mergulho.
Ele não me puxou com pressa, tampouco pediu licença. Não disse “posso?” — e ainda assim, soube exatamente o momento certo. Porque beijo bom é aquele que não precisa ser anunciado. É aquele que surge como tempestade em céu limpo: surpreende e transforma. De repente, meu corpo inteiro entendeu o que meus olhos ainda duvidavam.
O beijo que muda tudo não tem regra, mas tem peso. Tem silêncio depois, respiração que falha, coração que acelera. Não termina nos lábios. Vai para a espinha, os dedos, o pensamento. E vira critério. Porque depois dele, nenhum outro será como antes.
Passei dias lembrando daquele momento. Não pela intensidade – que foi suave. Não pelo desejo – que foi sutil. Mas pela profundidade. Tinha alma naquele beijo. Tinha intenção. Tinha verdade.
E isso… ah, isso é raro demais.
Não sei o que ele sentiu. Talvez tenha sido só mais um beijo. Talvez não. Mas, para mim, algo mudou. Eu mudei. Porque certos encontros não acontecem no corpo. Acontecem no tempo. E deixam marcas que não se apagam com a distância.
Desde então, beijos me parecem outros. Me parecem menos. Porque aquele beijo foi encontro de vontades e confissão sem palavras. Foi promessa sem juramento. Foi tudo que não se explica. Apenas se sente.
Não precisei perguntar se ele gostou. Não precisava saber se queria repetir. Porque não era sobre o depois. Era sobre o agora. E esse agora foi tão inteiro, que bastou. E talvez, por ter bastado, ficou.
A verdade é que, entre tantos toques, carícias e corpos que já cruzaram meu caminho… são raros os beijos que levo comigo. E ele me deu um. Um que ficou.
O beijo que muda tudo não pede continuidade. Ele deixa rastro, não prisão. Ele transforma o que vem depois – mesmo que o depois não venha.
Porque há encontros que são eternos… mesmo que durem só um beijo.